sábado, 31 de outubro de 2009

não vivo em NY

esperei que o teu número surgisse por magia no visor do telemóvel. apaguei-o no Sábado passado, meu Deus, já passaram cinco dias e nada!, mas sei que o reconheceria quando o visse destacado na intermitência nervosa da luz do aparelho. a minha imaterialidade continua a pedir-te aqui. e é o seu veículo, o corpo que te ofereci na noite em que me ofereceste o teu, que revela esse clamor, com as lágrimas e os suspiros que tão nova já me esmagam o peito. essa noite foi especial. não percebi o que nos aconteceu entretanto. fomos nós como sempre sonhámos, num sítio proibido cuja atmosfera carregámos de paixão. vocalizámos o "sou tua" e o "sou teu" muito depois de já o sabermos. continuamos a sabê-lo, mesmo fisicamente afastados. as juras de amor já foram trocadas, a promessa de eternidade também. esquecemo-nos foi de prometer que o espaço não existiria entre nós, para que não lá coubesse mais ninguém. mesmo quando não te vejo, sou tua. mesmo que não te tenha ao meu lado agora, és meu. lembro-me desse livro que me ofereceste, da Rita Ferro. já sabia, antes desse recado, que não gostavas de ciúmes. ainda só não percebeste que eu também não. é a mim que eles cortam por dentro. é a mim que me fazem sangrar. é a mim que o medo de te perder corta a respiração. sou eu que sofro comigo.
sabes, desejei hoje que me desses a vida que tinha antes de ti. antes, há muito tempo, quando ainda não sabia o que eram olhos e cabelo cor de seara de trigo. antes, quando pestanas louras não me atraíam - sempre preferi os morenos. antes de ter dado o meu primeiro beijo. antes, muito antes... quando era a miúda alegre, orgulhosa do seu ser. quando tinha prazer em ser timidamente púdica, antes de me tornar na puta em que me tornei depois de ti. antes, quando não brincava com outros homens enquanto te ausentavas, só para te esquecer, para ferir a tua memória, para me sentir desejada, querida, amada. antes, quando sonhava com a minha vida simples ao lado do tal príncipe que ia chegar no cavalo branco para me levar para um altar florido no cume de uma montanha onde os nossos rostos seriam beijados pelo sol quente do fim do dia. antes, quando queria-lá-saber de saltos altos e de calças que façam o meu rabo de J.Lo ficar perfeito. antes da futilidade, da vaidade, do álcool, do tabaco e das noites. antes de me tornar mulher. antes de ti, fui menina. e se me devolvesses tudo isso, eu saberia o que fazer de mim. voltaria a ser eu sem artefactos, sem jogos, esquemas, make up e cabelos difíceis de tratar. não evitaria chorar para não ficar com a cara coberta de rímel. usaria gloss porque não temeria afastar o teu beijo. talvez ainda usasse a minha velha máquina de escrever. talvez já soubesse tocar viola há anos. talvez tivesse tirado o curso em Londres. talvez fosse outra.
quem seria eu hoje se não tivesses havido tu?
transformaste-me numa Carrie Bradshaw para seres o meu Mr.Big.
só que eu não vivo em NY.

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